A lógica é a Mesma... Até Quando?
Horrorizados, indignados, sofrendo muito, em pleno luto.
Assim estamos todos nós, diante do brutal assassinato do menino João Hélio, no Rio de Janeiro. A vida para aqueles jovens e a vida daquela criança, pouco valiam... Nos debates, nas mesas dos bares, nos bancos das escolas, o assunto gera revolta e propostas de solução.: Diminuição da maioridade penal, pena de morte, no limite...
É bom pensar sobre a lógica que está por trás desta brutalidade e percebê-la na sua força e extensão no nosso dia-a –dia.. Trata-se da lógica do desprezo absoluto pela vida. Do endeusamento do consumo, do individualismo, do hedonismo!!
As mesmas raízes daquele ato insano, fundamentam a propaganda do carro que faz 300km/hora e é super equipado, mostrado ad nauseam na TV e outras mídias e que se torna objeto de consumo para poucos, objeto de desejo para jovens da classe média e forma de integração simbólica para jovens da periferia que também querem ter acesso à máquina possante ou qualquer outra assemelhada...Independente da classe social, desejam, a qualquer custo...
É a mesma lógica cínica que produz carros para o Brasil, com cintos de segurança que nem tão seguros são, sem airbags e outros itens necessários à proteção e tecem loas aos detalhes supérfluos de decoração . Afinal, a vida é supérflua, não é mesmo? Os mesmos carros, quando exportados, contêm estes e outros itens para proteger a vida... dos estrangeiros. A vida do brasileiro vale menos, não é? O lucro vale mais. Os assassinatos nas estradas são só um detalhe! A mesma lógica que despreza a vida e busca o lucro produz estradas esburacadas, prédios que desabam com famílias inteiras e obras urbanas ( o metrô de SP é só um exemplo) inseguras . São mortes que, de tão cotidianas, nem nos comovem mais...
A mesma lógica cínica está presente nas grandes redes de TV Como é bonito, uma vez por ano, fazer um grande show para arrecadar dinheiro para trabalhos em bairros de periferia e, como dizem, dar um sentido à vida de crianças e jovens e durante o dia inteiro, o ano inteiro, instilar a violência de forma gramourizada nos filmes violentos, desenhos animados violentos, novelas violentas!! E, eventualmente, fazer uma discussão sobre porque os jovens estão tão violentos? Por que estão bebendo mais e mais cedo? Isto, mantendo a entrada de dinheiro da propaganda de bebidas, com cenas de completa alegria, moçada em festa, linda, loura, bem vestida ( num país que tem 2/3 na pobreza ou na linha da miséria... ) ... A mesma lógica nefasta nos informa , de leve , que observando o desastre produzido pela situação de anomia das nossas crianças e jovens, está sendo “descoberta” a importância da família, como referência primeira para a criança e o adolescente. Simultaneamente nos massacram,
dia-a-dia, com cenas de novelas nas TVs de nossas salas, que colocam abaixo valores caros a qualquer cultura:respeito pelo outro, relações estáveis, autoridade dos pais ( atenção!! Antes que me questionem... Não é autoritarismo, por favor.) solidariedade, diálogo... A mulher nas novelas – na sua maioria- é vista como objeto, fútil, obcecada pelo próprio corpo e pelo consumo. Os homens têm que ser machões, arrivistas... A mesma lógica coloca a sociedade numa postura a-crítica e impotente quando emburrece parcelas do povo em programas repugnantes como o Big Brother Brasil!!
Uma população mediocrizada é incapaz e discernir, de propor novas posturas e de lutar. Eventualmente debate-se sobre a situação da educação no Brasil e massacram-nos, ao mesmo tempo, com noticiários mal feitos,cheios de violência, músicas de baixo nível que contribuem para a imbecilização. Mostram, muito menos a riqueza que vem das favelas, sua arte, cultura, seus moradores que trabalham duro, a moçada que, contra tudo e contra todos, segue estudando, trabalhando,etc.
A mesma lógica que arma o adolescente das vilas e favelas é a lógica do descaso pessoal e coletivo. A solução proposta? A pena de morte. Esquecemos que a pena de morte já foi decretada há muito tempo para os pobres. As crianças , em sua grande maioria, já nascem humilhadas, maltratadas na família, na vizinhança e olhadas com receio pelas classes média e rica... Já estão sendo assassinadas em brigas de gangues, em pontos de venda de drogas, e se embebedando nos bares... Muitos estão sendo torturados e assassinados nas cadeias, nos presídios. Durante a Constituinte, um parlamentar solicitou ao Senador Ronan Tito, de MG,que apoiasse a defesa da pena de morte. Ele, com posição firme contra a proposta, brincou que apoiaria sim, desde que se colocasse um adendo: Negro, pobre e prostituta não poderiam ser punidos com pena de morte durante 30 anos. É claro que o tal parlamentar não topou, não é mesmo? Estamos lutando e caminhando na direção de uma justiça mais “justa” e democrática, mas é só olhar nossos presídios e ver que tipo de gente, aos milhares, se amontoa por lá... Pois bem... O que fazer.Todos nós, crentes e não crentes. Ricos, pobres, remediados. Letrados e não letrados ? Especialmente nós, cristãos de todas as diferentes igrejas. Sabemos, pela leitura da Palavra que esta realidade nada tem a ver com a vontade de Deus. Que esta cultura da morte vai contra o essencial: “ Eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10). Sabemos que não seremos julgados pelo número de idas às Missas aos domingos ou aos cultos ( isto é muito importante, claro, mas não suficiente...). Nem seremos julgados por quantas tardes de louvor, ou quantas promessas fizemos e cumprimos. Os rituais tradicionais
agradam a Deus se, como conseqüência, levam a ações coerentes na construção do Reino: Justiça e Paz para todos, sem exclusão A REFERÊNCIA É A MISERICÓRDIA, A COMPAIXÃO.. “Tive fome e me destes de comer. Tive sede e me destes de beber, era migrante e me acolhestes, estava nu e me vestistes, estava encarcerado e fostes ver-me”. (Mt 25,35-36)_ Indignar é preciso. Muito mais que isto é preciso por a mão na massa! Ser fermento na massa. AGIR. Você pode!! Você pode , individualmente, assumir algum tipo de pastoral na sua igreja. Você pode fazer uma discussão bem fundamentada na sua família de forma que todos participem, COMO GRUPO, em alguma luta por mais justiça. Não só discussão! Façam juntos algo de concreto! Saúde, educação e cultura de qualidade são DIREITOS! É dever nosso cobrar do Estado a efetivação de boas políticas neste sentido. Mas é dever da sociedade – nosso - individualmente e em grupos e associações- criar as condições para que todos tenham acesso a estes bens. Especialmente os mais pobres. Você sabe algum ofício? Sabe tocar algum instrumento? Sabe alfabetizar? Sabe ouvir e aconselhar? Tem algum dom que faça as pessoas mais felizes? Então, mãos à obra!! O seguimento de Jesus nos impele a repartir os dons e não escondê-los... Há muita gente se doando em associações, ONGs, Sindicatos, organizações em defesa da criança e do jovem, dos idosos, da ecologia... Tantas são que basta procurar, conhecer sua seriedade e...AGIR! Que o Espírito Santo - Espírito de Amor, Espírito Criador, Espírito de Compaixão
- nos fortaleça numa espiritualidade de serviço. De presença transformadora. Que nos encha de luz para sermos fermento na massa e luz no mundo
Zélia Castilho Rogedo
Ordem Franciscana Secular- BH
Sinfrajupe – Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia - MG