Há 43 anos atrás...

       Naquele tempo não havia bermudas. Cortávamos as velhas e saudosas calças Lee, hoje chamadas de "jeans" e criávamos a nossa moda, personalizada. Jeitinho brasileiro. A minha era desbotada na água sanitária e com uma inscrição rebelde,  "Viva Che Guevara !"  escrita na coxa.

        Lembro-me do dia em que comprei o Lp "Os Reis do yé, yé, yé", o sucesso do momento, e fui para a "casa do Celso", Sabinópolis 43, "point" da juventude do pedaço. A pracinha São Francisco era nosso território. O Carlos Prates era uma família. Ainda havia Cine Asteca, Bar do Homero e políticos honestos. Acreditem! 

         Na casa do Celso tinha Vitrola, que depois virou "Três em um", (gravador, toca-fitas e toca-discos), evoluiu para  simplesmente "som", enorme trambolho com caixas imensas, e  hoje é um diminuto e raquítico Mp3, bem mais prático, uma das  boas coisas do mundo globalizado.

       Era um jovem cabeludo, que amava os Beatles, Roberto Carlos, Erasmo e Wanderléia. Os  Rolling Stones ainda não estavam em evidência.
       Putz!  A data de nascimento vai ficando cada vez mais antiga...

       Estávamos lá, sentados em frente da casa, ouvindo "A hard day's night", Celso, Cleder e Newton, Zezé Lucílio e Dilmar, Marcão e Chico Morais, Massara, Cal, Lucas Baroni, Jorginho e Fauzi, Tom Carlos, felizes e não sabiam...
       
       De repente, chega Onésimo Vianna, sério, terno e gravata,  olha com a habitual desaprovação adulta, dentre todos me escolhe e solta o verbo:
       - Você, um rapaz de aparência até distinta, usando essa calcinha curta escrita  "Viva Che Guevara", isto é um absurdo!!!
       Entrou, sem me dar chance de resposta, que certamente não viria, o "coroa" tinha suas razões.

       Confesso que só gostei  "da aparência até distinta".  Lembrei-me do meu pai, que todo santo dia dizia a mesmíssima coisa: 
       - Vá tagliare questo  capello e butare roupa di uomo!!!, vociferava no seu portoliano de calabrês enfezado, corta este cabelo e bota roupa de homem!
       Saco!  Saio de casa pra não ouvir reprovações do velho e encontro um segundo pai, tão severo quanto o primeiro e com a mesma cara ruim, pensei com os meus botões metálicos.

       Este foi o primeiro contato. A primeira impressão é a que fica?  Não posso concordar. Ou então vamos combinar que o dito "toda regra tem exceção" continua valendo. Mesmo!

       Passados 43 anos de boa convivência em que nos tornamos amigos, companheiros de pelada, adotei e fui adotado,  a família Vianna/Castilho, Seu Neném e Dona Chiquita, filhos, netos e toda sua descendência permanecem num lugar especial do meu coração e da minha mente.
                       
                       Para todo o sempre.


R.Oliva
Fevereiro 2008
         


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